IBOPE E OUTROS TEMAS

Carlos Novaes, 03 de setembro de 2014

1. A nova pesquisa IBOPE mostra reação de Dilma?

Não. Essa pesquisa mostra que a situação divulgada pelo DataFolha em 29 último segue inalterada. Os números são os mesmos, se considerarmos as margens de erro, e eles mostram, como já vimos, a alteração havida no comportamento dos eleitores que não tinham preferência por Dilma, ou seja, que estavam em outras posições e deslocaram sua preferência para Marina. A candidata do PSB não avançou nesses míseros cinco dias que separam as duas pesquisas, o que indica o óbvio: o eleitor que não mudou de preferência exigirá mais informação para mudar, se vier a mudar.

2. Os números novos são resultado dos ataques do horário eleitoral a Marina?

Esses ataques não podem ser os responsáveis por Marina não ter crescido nesse intervalo de cinco dias, e por duas razões: primeiro, não houve tempo hábil entre estímulo e resposta; segundo, dificilmente o eleitor que já não vota em Dilma responderá positivamente a uma mensagem tão agressiva partindo dela – o mais provável é que ele venha a ficar ainda mais contra Dilma, prestando atenção benévola em Marina. Ou seja, Marina pode até crescer.

3. Muitos vem apontando semelhanças entre Marina, Jânio e Collor. Isso faz sentido?

Jânio e Collor foram figuras de ascensão política meteórica enquanto criaturas solitárias, sem laços com dinâmicas institucionais e, ainda mais, sem laços com uma causa, ambos vociferando contra uma hipotética ordem maléfica reinante, sem oferecer parâmetros propriamente racionais para o voto. Marina não apresenta NENHUMA dessas características. Marina tem uma sólida reputação pública, construída com trabalho em equipe, defendendo causas que vem sendo acompanhadas publicamente há décadas. Foi parlamentar partidariamente disciplinada e ministra de Estado eficaz e sensata, sem que se possa apontar qualquer comportamento imprevisível ou contraditório em sua atuação. Não há, portanto, base para essa comparação, que só parece verosímil a quem teme a mudança por temer mudança. Os problemas da candidatura dela são outros.

4. A falta de apoio de um partido grande, somada ao fato de que os grandes partidos estão contra ela, não são carências que vão impedi-la de governar?

Não. Essas circunstâncias vão pôr dificuldades, mas não vão impedir. E mais: consideradas em si mesmas, essas dificuldades que antevemos deveriam ser prova das virtualidades positivas de um governo Marina, se considerarmos que ela não é nenhum Collor ou Jânio. Ou seja, não dá para fazer o discurso da mudança, ou a crítica à nossa representação parlamentar lamentável e, ao mesmo tempo, ver como problema o fato de que essa representação inadequada vai ser desafiada por um poder executivo voltado à mudança. Afinal, o que queremos: um governo que mude ou um governo que se acerte com esse parlamento que não nos representa? Se Marina fosse um Jânio ou um Collor, sem lastro prévio, haveria razão para que o temor dos riscos viesse a inibir o voto dos mais responsáveis, mas considerando o passado da candidata, os riscos não estão aí.

5. E onde estão os riscos?

Os riscos estão nos vínculos da candidata (não na falta deles), nas propostas claras da candidata (não no caráter nebuloso delas). Marina recuou no tema dos homossexuais por pressão institucional da sua igreja. Se o recuo tivesse se restringido à ampliação dos direitos civis deles, teria sido péssimo, mas não seria desastroso porque os mais benevolentes, entre os quais não me incluo, ainda poderiam dizer que ela recuara por razões de consciência pessoal. Mas não foi “só” isso. Marina recuou ali onde se abrigam os agressores aos direitos dos homossexuais. Ou seja, mais do que recuar diante da necessidade de ampliar o respeito à diferença, ela escolheu negar instrumentos adicionais para conter e punir agressores de quem é diferente.

Marina adotou a meta de conceder autonomia  legal ao Banco Central, privando o Executivo de um dos braços de regulação da política econômica. A crise da Europa deixou à vista de todos a desgraça dessa autonomia para a Grécia, Espanha, Portugal, etc. Ela, que prega mais Estado nas políticas sociais, com excelentes propostas no lado da entrega do balcão, escolhe amputar um braço indispensável para implementar a base econômica dessas propostas, num liberalismo de alto risco. Definitivamente, ela não sabe o que diz, aqui.

Marina também nada diz sobre o problema tributário ali onde ele é realmente assunto relevante quando se pensa no combate à desigualdade: como fazer a acumulação de riqueza ser contida? Ela repete o discurso vazio do PT em prol de políticas sociais, vazio porque não enfrentou o problema da riqueza (o Lula se ufana de que em seu período os ricos ganharam dinheiro como nunca), limitação que já mostrou, na prática, que o partido segue os liberais ali onde eles pregam o direito à acumulação infinita. Marina vem se mostrando por demais influenciável pela companhia de gente muito rica e de seus “pensadores” de estimação. São pessoas de cujas boas intenções sociais não podemos duvidar, mas que estão tão impedidas de pensar um governo de combate à desigualdade quanto os atuais parlamentares estão impedidos de pensar regras eleitorais que ameacem as rotinas com que reproduzem seus êxitos. Marina parece não ter entendido que quando se põe as raposas para cuidar do galinheiro o único benefício a que se pode aspirar é assistir as raposas brigarem quando as galinhas escassearem.

2 pensou em “IBOPE E OUTROS TEMAS

  1. Anderson Thadeu Nunes

    Carlos Novaes, acompanho seu trabalho desde quando compunha a bancada do Jornal da Cultura e, por enxergar em você lucidez e integridade passei a acompanhar suas opiniões em outras mídias.
    Eu estava ficando preocupado ao ver em seus textos anteriores, neste blog, o que me parecia uma defesa à candidata do PSB. Todavia, neste último artigo minhas preocupações se dissiparam, pois no item “5. E onde estão os riscos?” você destacou minhas preocupações/(motivos para não votar) na referida presidenciável. Há a questão dos direitos – das ‘ditas’ minorias-, as questões fiscais, mas a principal é com relação à entrega do Banco Central ao capital financeiro internacional, que como você bem destacou, arrasou economias de diversos países com desastrosas consequências às suas populações. Acrescentaria agora, que ela também é a favor da anistia aos torturadores do golpe midiático-civil-militar. Infelizmente, não resta outra saída que não votar no PT, para não ficar pior.
    Uma pena Luciana Genro ser uma candidata com desempenho pífio nas pesquisas, mesmo assim terá meu voto no primeiro turno – acho que é uma resposta mais contundente ao PT do que votar na direita travestida de “algo novo”.
    Obrigado pela sua atenção!

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