Abril de 2022
Nesse intervalo em que nada publiquei neste Blog perdi minha mãe, Mathilde, que faria 93 anos em maio próximo. Por cerca de dez anos ela sofreu consequências do desenvolvimento progressivo do mal de Alzheimer que, como se sabe, no início afeta a memória cognitiva e, com o tempo, gera confusão crescente e chega a comprometer a memória motora, quando a pessoa apresenta dificuldades para lembrar como andar, engolir etc. Embora tenha apresentado graus desses sintomas típicos, e ainda que sob alguma confusão, minha mãe andou, comeu e foi capaz de nos reconhecer até um dia antes da morte. Isso foi possível porque ao longo de todo o desenvolvimento da doença ela morou com um dos 8 filhos que teve, meu irmão Marcos Novaes. Marcos e a esposa, Renata Karl, dispensaram a ela, por dez anos, zeloso acompanhamento cotidiano, pelo qual expresso aqui todo o meu reconhecimento. Graças ao desvelo deles, guardo uma lembrança querida e muito significativa da relação que tive com minha mãe: em algum momento mais para o fim de 2019, altura em que a doença já avançara bastante, fiz uma visita a ela na casa de Renata e Marcos. No papo que se seguiu ao almoço, juntou-se a nós um velho e querido amigo. Embora preferisse ficar em silêncio, minha mãe gostava dessas conversas e nós não deixávamos de integrá-la, embora eu tivesse alguma dúvida sobre o quanto ela acompanhava do ziguezague vivaz. Com a presença do amigo, o papo enveredou para o tema das novas tecnologias e falamos sobre o quanto coisas como celulares, máquinas e ferramentas (aos quais chamo de memória reificada) dominam hoje a nossa vida, não só trazendo aprendizados e exigindo aprendizados, mas também, com certa magia, dispensando aprendizados, nos levando a fazer o que a própria memória reificada exige, sem que saibamos bem como ou porquê. A certa altura, por entre um sorriso que era típico dela, dona Mailde (como carinhosamente a chamávamos) nos deu mais uma demonstração da sua persistência e, para minha alegria, afastou qualquer dúvida acerca do seu engajamento na conversa saindo-se com essa: “para quem quer trabalhar, até as ferramentas ensinam, não é?”
Meus sentimentos, prezado professor.