BOLSONARO PODE ENTRAR EM RUÍNA?

Carlos Novaes, 20 de agosto de 2022

Com acréscimos em Fica o Registro, em 21/08.

Ao comparecer à posse de Moraes na presidência do TSE, Bolsonaro sinalizou um pedido de trégua típico de quem está perdido e, então, tomou uma invertida não menos típica dessas situações: ao invés de aceitarem a trégua, os adversários avançaram para o nocaute. De fato, ao pedir trégua, Bolsonaro deu um passo além do abandono do golpismo, ele abandonou também qualquer pretensão de ser visto como antissistema. Ao avançarem para o nocaute, os adversários deixaram claro que era tarde demais.

Contribuem para essa percepção outros quatro episódios desses dias: primeiro, no âmbito do Estado, os militares tomaram a iniciativa de sabotar o 7 de setembro pretendido por Bolsonaro, ainda que ele próprio já viesse indicando não querer dar tom golpista ao evento – é que os militares foram além, e retiraram do desfile sua característica de demonstração de força; segundo, líderes do Centrão já estão explicitando o abandono do barco, dando a público divergências com Bolsonaro. Terceiro, no âmbito da sociedade, o lamentável episódio do “tchutchuca do Centrão”, quando um preconceito repelente, de que o próprio Bolsonaro é partidário, foi usado como estigma contra ele mesmo. Quarto, no campo religioso, as mentiras evangélicas sobre fechamento de igrejas por Lula estão sendo desmentidas por gravações antigas dos mesmos pastores… Nos quatro casos, Bolsonaro acabou por ter contra si desmoralizações adicionais à que ele próprio havia protagonizado no TSE.

Trocando em miúdos: por mais que o frentismo erre ao insistir na defesa de uma democracia que não está ameaçada pelo que o besta diz, em poucos dias Bolsonaro ficou sem condições de tirar proveito desses erros, pois já não pode fingir ser o que nunca foi: um político antissistema. Pelo contrário, Bolsonaro, mais uma vez, explicitou sua rendição ao sistema e, pior, dessa vez, o sistema, em terno e farda, o recusou!

Ante uma reviravolta como essa, num intervalo de tempo tão curto, típica de situações instáveis, não será surpresa se a candidatura de Bolsonaro entrar em ruína — afinal, são três reveses simultâneos e inapeláveis: (i) ficou escancarado que ele tem os comandos militares da ativa contra si; (ii) sua base autoritária já não tem onde apoiar o autoengano acerca de uma postura golpista do chefe; (iii) dissemina-se na opinião pública a ideia de que Bolsonaro já era e não merece respeito algum.

Se for assim, a reta final do primeiro turno pode trazer grandes surpresas.

Fica o Registro:

– É lamentável que essa história de “tchutchuca do Centrão” tenha ganho a força que ganhou entre a autointitulada esquerda. Mostra bem o quanto teremos que caminhar até poder estar à altura do largo alcance do que se convencionou chamar de politicamente correto. Estão glorificando preconceitos.

– Não menos lamentável, repugnante até, é essa história de chamar Moraes de Xandão, nada diferente de chamar Bolsonaro de Mito. Quero ver o que esse pessoal vai fazer com o Xandão quando as preferências autoritárias dele se voltarem contra o possível governo Lula. Estão glorificando o facciosismo.

– Ao insistir em integrar Dilma à campanha, ao defendê-la em manifestações públicas, Lula está abusando da tolerância de uma parte fundamental dos eleitores que estão com ele nessa eleição. Por mais que ela tenha sido injustiçada, e o foi, é uma imprudência eleitoral pretender enfiar isso goela abaixo daqueles que pensam diferente, mas estão com Lula porque não veem alternativa. Essa atitude acrescenta alguns centímetros ao salto alto…

– Enquanto o frentismo faz a defesa inócua da democracia (que cerca de 80% de nós defendem), o Janones, do jeito dele, com as limitações dele, foi ao que é central: a desigualdade, via denúncia do Auxílio Brasil oportunista do Bolsonaro. Quem faz o óbvio numa conjuntura em que os outros erram, vira gênio.

– Chega a ser constrangedor ver as comemorações em torno da recepção dada a Lula na posse do Moraes, por contraste com o isolamento de Bolsonaro na cena. Ora, Lula foi prestigiado precisamente porque é a esperança das facções hegemônicas no Estado de Direito Autoritário, papel que ele desempenha com a cobertura da inócua defesa da democracia. Comemorar sem crítica essa situação mostra cegueira ante o que está em curso. Para detalhes, ver, entre outros, este artigo aqui.

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