Carlos Novaes, 30 de outubro de 2022
Hoje no Twitter a @Anitta fez duas ponderações simples, sugerindo reflexão:
“Se o voto é secreto protegido pela lei. Por que será que as pesquisas de voto são permitidas pela lei? Não parece um pouco ambíguo? Bom refletir sobre.”“
Como as redes sociais são o âmbito das certezas cínicas e dos insultos, a manifestação da moça foi recebida com a indignação dos autoritários sem causa. Como não poderia deixar de ser, ninguém (pelo menos até onde tive paciência de ler) chegou nem perto de dar uma resposta minimamente correta às ponderações e ao convite que ela fez.
Minha posição sobre a urna eletrônica foi desenvolvida com detalhes aqui. Para responder à @Anitta, digo apenas o seguinte:
@Anitta , nada há de “ambíguo” porque (1) “Intensão de voto”, que é o que pede a pesquisa, não é voto na urna; (2) O voto é secreto não para impedir que o eleitor o declare, mas para impedir que ele faça prova do que declara (quando declara).
Quer dizer, o eleitor está impedido de fazer prova do voto que depositou na urna, isto é, ele está obrigado a ser livre. “Obrigado a ser livre” também nada tem de “ambíguo”, ou paradoxal, pois a liberdade do eleitor não é um atributo individual, mas uma condição política, propriamente social — por isso ele tem a liberdade individual de declarar o voto, mas está constrangido pela liberdade coletiva, que o impede de fazer prova dessa declaração. Daí porquê, não é ele, o eleitor, o guardião do segredo do próprio voto; nem tampouco o é a Justiça Eleitoral (TSE e TREs). Não. O guardião do segredo do voto é a urna (eletrônica ou não), local onde dormem unidos em sua força os votos incógnitos dos eleitores.
Fica o Registro:
– A Folha de S. Paulo de hoje traz artigo de Elio Gaspari sobre o último debate entre Lula e Bolsonaro. Quero crer que o que Gaspari viu foi o que a maioria de nós viu. A explicação para o que vimos, porém, Gaspari não deu, mas está aqui desde ontem.
Sr. Novaes,
Qual a utilidade dessas pesquisas, além de funcionar como instrumento de influencia sobre os eleitores em quem devem votar para como dizem ” não perderem o voto”? Usam as pesquisas para fazerem suas apostas? Sem elas, não saberiam em quem votar? Votar no que vai ganhar? O voto vinculado ao voto dos outros?
Pesquisas trazem informações sobre o que se passa no momento em que são feitas. Elas são úteis para quem entender que precisa delas, por exemplo: os próprios candidatos, estrategistas de campanha, jornalistas, profissionais/empresas que tenham interesses diretamente ligados à política e aos resultados de uma eleição, os próprios eleitores, analistas e cientistas políticos, como eu, e muitos outros. Todos esses agentes enxergam utilidade nas pesquisas. As pesquisas não adivinham o futuro, nem têm esse propósito. Eles falam do presente em que foram feitas. Logo, decidir votar em quem está na frente só faz (algum) sentido se a pesquisa for feita e publicada no dia da eleição. Mas é proibido publicar pesquisa no dia da eleição. Não há nenhum problema em decidir com base em vínculos com outras pessoas. Na verdade, é isso mesmo que quase todo mundo faz, por isso existem os partidos, os apoiadores e os grupos de eleitores que fazem campanha para os seus candidatos, avisando as pessoas conhecidas a quem apoiam. Finalmente, não vejo problema se o eleitor, mesmo sem dispor de bola de cristal, preferir votar em quem julgue que será o vencedor, afinal, esse é um valor subalterno como outro qualquer, não valendo menos do que o time de futebol ou a religião do candidato.