OMISSÃO DE AUTORIDADES INCITOU BADERNA

Carlos Novaes, 08 de janeiro de 2023 – 17:02

Com uma conclusão em 09/01, às 17:30h:

Hoje começa o governo Lula

Com acréscimos anteriores, ao longo do dia 08, às 17:35h, 17:45h, 18:09h, 20:33h, 20:46h, 21:12h, 22:06h, e mais acréscimos em 09 de janeiro, às 00:37h

08/1 – 17:02h — A primeira explicação para que essa arruaça pré-anunciada chegasse ao ponto em que chegou, com a invasão sem contenção alguma das sedes dos três poderes da República, é a conivência do governo do DF e da respectiva PM. Simplesmente nada foi feito pelas autoridades diretamente responsáveis para dissuadir um desdobramento dessa monta, mesmo com a prévia arregimentação pública que veio sendo feita ao longo dos últimos dias.

Também é verdade, entretanto, que essa inação, por sua vez, estava pré-anunciada no comportamento do Ministro da Defesa e do Ministro da Justiça de Lula. Múcio, na Defesa, não via crime algum nos atos golpistas e dizia ter amigos no acampamento do DF. Flávio Dino, por sua vez, fez corpo mole diante da gravidade da situação, conduzindo uma indevida política de boa vizinhança com o governo bolsonarista do DF, tudo no melhor estilo faccioso.

Em suma, estamos diante de uma baderna anunciada, com desdobramento arruaceiro incitado pelo comportamento leniente das autoridades distritais e federais, que deu ocasião para uma sensação de liberou geral.

Agora, uma vez acontecido, é de perguntar: onde está o presidente da República?!

Lula precisa se dirigir imediatamente ao país. O silêncio dele está em linha com a nomeação de Múcio para a Defesa.

Lula tem de demitir imediatamente esse ministro da Defesa e, se necessário, tomar outras providências na área militar, a depender do que for indispensável para restaurar de imediato a ordem na esplanada dos poderes. Ou ele faz isso hoje, ou não terá autoridade para exercer plenamente a presidência da República, mesmo nos limites estreitos do jogo de facções interessadas no exercício faccioso dos poderes institucionais de modo a reunir poder para fazer dinheiro.

17:35h

Há na mídia notícia de que o Exército pôs tropa em prontidão para possível operação GLO. Além disso, generais estariam discutindo uma mudança de posição em relação ao acampamentos golpistas nas áreas próximas a prédios militares. Ora, a operação GLO já deveria ter sido decidida por Lula e posta em prática. A demora reflete inação típica dos melindres que orientaram a nomeação de um Ministro da Defesa como Múcio. Os generais começam a sentir as perdas com sua postura leniente, que discutimos em análises recentes.

17:45h:

Randolfe Rodrigues pediu intervenção federal na segurança do DF. Tem toda razão. É um assombro a lentidão de reação do Lula. A tendência acomodatícia dele mostra toda a sua limitação como real líder político. Não é hora de contemporização. Ele está a perder oportunidade de ouro contra esses imbecis que não sabem a extensão da própria fraqueza.

18:09h:

Lula está a fazer pronunciamento, no qual já anunciou decreto de intervenção federal no DF e prometeu responsabilização inclusive para agentes do governo federal que tenham concorrido para a ação dos vândalos. Demorou mais de três horas, mas acabou dizendo o que devia ser dito. Vamos ver.

20:33h:

No curso desta noite, Lula terá tempo de refletir sobre o absurdo que aconteceu nesta invasão aos palácios dos três poderes da República, se dará conta da oportunidade que essa baderna criou, e não poderá deixar de chegar a uma conclusão e a uma decisão: os dois ministros cujas pastas estão diretamente vinculadas aos fatos não se mostraram à altura da tarefa nessa hora crucial e não podem continuar no ministério. Múcio e Flávio Dino têm de ser demitidos. Para Ministro da Defesa, o ideal seria Nelson Jobim. Para a Justiça, Jacques Wagner ou Celso Amorin.

20:46h:

Já às 17:02h, no texto original com que abri esse acompanhamento dos fatos, escrevi que Dino havia se conduzido equivocadamente ao manter facciosas relações de boa vizinhança com o governador do DF. Agora à noite, o governador, além de fazer um ridículo “pedido de desculpas” a Lula (como se se tratasse disso), ainda se dirigiu ao presidentes da Câmara e do Senado como “meus amigos”, numa facciosa falta de protocolo institucional. Como se não bastasse, acrescentou que ele e Dino foram “pegos de surpresa pela magnitude da manifestação”, declaração estapafúrdia por duas razões: primeiro, como falar em surpresa, se houve dias de convocação?!!; segundo, ele continua com salamaleques recíprocos com Dino, como a ressaltar que ambos estão no mesmo barco… E estão mesmo! Lula não pode tolerar a continuação de Dino no cargo.

21:12h:

Em entrevista em curso, Dino deixou claro, agora há pouco, que protegeu o governador do DF de qualquer medida mais drástica, encarecendo que Lula limitasse a intervenção à área da segurança. E o fez mesmo estando claro que o governador deliberadamente não tomou providências necessárias a evitar os fatos, o que implica prevaricação. Dino está a defender enfaticamente o governador. Note, leitor, como essa proteção a um bolsonarista empedernido deixa clara a política facciosa em ação: para eles, trata-se, sempre, de fazer acertos que limitem danos às relações recíprocas no âmbito do Estado de Direito Autoritário-EDA, mesmo com sacrifício de oportunidades de levar o país na direção de um Estado de Direito Democrático. E tudo isso com Dino reconhecendo que o governo do DF alterou o combinado na última hora, passando a não impedir a entrada de pessoas na esplanada!!

22:06h:

A imprensa noticia dois novos absurdos: 1. que os arruaceiros voltaram a se aninhar no acampamento ao lado do QG do Exército, no DF; 2. que em reunião com o comando do Exército, o ministro da Defesa, José Múcio, estaria a combinar uma forma de acabar com os acampamentos “sem confronto”!! Como assim? O confronto já foi iniciado! Como é que Lula tolera isso? Como é que Lula não percebe que está a, desnecessariamente, aceitar um atestado de minoridade na condução do país??!! Múcio não poderia estar negociando nada. Ele já deveria ter sido demitido.

Madrugada de segunda-feira, 09/01

00:37h:

A imprensa traz duas notícias que devem ser avaliadas de maneira cruzada: 1. o Exército impediu a PM de entrar na área do acampamento golpista defronte ao QG, no DF. Informa-se, ainda, que o interventor nomeado por Lula está em reunião com Múcio e os militares no local. 2. Alexandre de Moraes afastou do cargo o governador do DF, por 90 dias.

O cruzamento é o seguinte: enquanto Lula pipoca e aceita que sua autoridade seja desafiada, tanto amparando-se nas conversinhas facciosas de seu ministro da Justiça (que, depois de nada de concreto ter feito contra o acampamento golpista, acintosamente protegeu o governador bolsonarista), quanto deixando rolar a autodeclarada conivência de seu ministro da Defesa com os golpistas; Moraes, ao contrário de Lula, avança o quanto pode, explorando todos os recursos do poder legal de que dispõe contra os arruaceiros, precisamente porque tem a leitura correta de que não passam disso: arruaceiros.

Nunca imaginei que algum dia faria isso, mas aqui vai um trecho da decisão de Moraes, que, entre outras providências, ainda deu 24 horas para a dissolução total dos acampamentos, com a prisão dos golpistas:

“Absolutamente NADA justifica a existência de acampamentos cheios de terroristas, patrocinados por diversos financiadores e com a complacência de autoridades civis e militares em total subversão ao necessário respeito à Constituição Federal. Absolutamente NADA justifica a omissão e conivência do Secretário de Segurança Pública e do Governador do Distrito Federal com criminosos que, previamente, anunciaram que praticariam atos violentos contra os Poderes constituídos.”

24h depois, a Conclusão:

Governo Lula começa sob signo da fraqueza

09/01, às 17:30h:

O cenário pós-baderna é muito instrutivo, especialmente para quem acompanha este blog.

Desde os escombros, que são também os escombros de um blefe monumental, eleva-se uma figura central: Alexandre de Moraes, que tomou definitivamente para si a bandeira da “ordem republicana”. Moraes conseguiu isso fazendo o que Lula deveria ter feito: mandou dissolver os acampamentos golpistas nas imediações de instalações militares. Moraes obrigou os milicos, constitucionalmente chefiados por Lula, a fazerem em 24h o que Lula não fora capaz de os mandar fazer durante uma semana, justamente a semana inaugural de um novo mandato seu na presidência da República…

Enquanto Lula ficou administrando o jogo miúdo das facções, enredado pelas tibiezas de seus ministros da Justiça e da Defesa, sempre em busca de uma acomodação das diferenças tão típica do elitismo brasileiro saído da desigualdade extrema, enquanto Lula se enredava nisso, eu dizia, Moraes, que aprendeu a fazer o jogo das facções num plano mais amplo do que o desses acertos miúdos, manejando a Constituição e a autoridade dos Tribunais Superiores, fez o que qualquer um que tenha entendido a natureza blefadora do golpismo não poderia deixar de ter feito (especialmente depois dos embates sobre a urna eletrônica, como expliquei minuciosamente neste vídeo aqui).

Moraes obrigou os milicos a saírem da zona de conforto — na qual garantiam o seu, dentro da ordem e, ao mesmo tempo, ficavam flertando com o golpismo, à espera de acumular força para a barganha facciosa no âmbito do Estadoe explicitarem o único lado que não poderiam deixar de ter, o lado do respeito à lei, pois eles nunca tiveram condições de (nem pretenderam) dar golpe, ou seja, de levar até o fim suas facciosas simpatias oportunistas pelo movimento bolsonarista, como há tempos expliquei nos vídeos acima citados.

Sem o saber, os golpistas tresloucados deram – num domingo, claro -, final escatológico a uma farsa cuja encenação se estendeu por anos e foi alimentada por blefes: a farsa do golpe com apoio nos militares para a volta de um Estado Autoritário. Enfim, jamais houve o que temer dos militares, como recentemente, combatendo a tibieza de Lula, detalhei aqui.

Fim de jogo, e Lula passou recibo de fraco — embora pouca gente enxergue isso. Quando Moraes vier a atuar contra Lula, valendo-se inclusive dos créditos acumulados contra os imbecis blefadores, é que muita gente talvez venha a enxergar o que quero dizer com jogo de facções em alto nível…

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