OOOHHH! QUANTA INDIGNAÇÃO…

Carlos Novaes, 08 de setembro de 2022

Com acréscimo em Fica o Registro às 23:12h

As mídias convencional e “alternativa” estão repletas de artigos inconformados com o que Bolsonaro fez ontem. Talvez a “análise” mais representativa de tudo o que está circulando, justamente por ficar na média entre esquerda-centro-direita das facções estatais de oposição (com seus capilares na classe-média “consciente” da sociedade civil), seja o artigo em que Míriam Leitão faz um apanhado, digamos assim, global, do que se passou. Está tudo lá, como numa Frente: ela parte da óbvia apropriação eleitoral de uma efeméride nacional (quanto patriotismo!); passa pelo autoritarismo golpista de Bolsonaro (quanta indignação!); reclama da quebra de protocolos institucionais (oohhhh); alerta as instituições (esses espíritos que nos rodeiam, ora colapsados, ora funcionando…); e, finalmente, se debate, nesciamente, no beco sem saída ao qual, sem perceber, seu próprio artigo a levou, nos deixando com este lapidar último parágrafo:

Se Bolsonaro sair de novo impune de todo o escandaloso abuso de poder exibido durante todo esse infeliz Sete de Setembro, é porque o país se deixou encurralar por um golpista que usa todas as técnicas de manipulação para destruir a democracia.

Que potência!

Agarrada ao Estado de Direito Autoritário-EDA que ela ajudou a construir, fazendo das franquias democráticas meros apêndices (dele dependentes), Leitão não pode enxergar que para punir Bolsonaro (seja por falta de decoro, seja por crimes) é necessário ir além do Estado de Direito Autoritário em sua crise, (crise que é de legitimação, não institucional), uma vez que a preservação desta forma estatal em plena crise traz embutida, como uma necessidade, a incapacidade mesma para, por exemplo, conduzir um processo de impeachment, como há anos detalhei aqui, entre outros textos — resumindo: afinal, quem tem legitimidade para fazer o impeachment de Bolsonaro: esse Congresso?!

Leitão se enche de indignação para repudiar o golpe ficcional de Bolsonaro (que não passa de blefe, como, mais uma vez, vimos ontem), mas, por exemplo, apoiou o golpe real contra Dilma: sua convivência conveniente com o caráter Autoritário do nosso Estado de Direito — cujas facções majoritárias derrubaram Dilma e, agora, numa generalização da regra, têm incrementado o autoritarismo para dar combate aos aliados do ainda mais autoritário Bolsonaro — essa convivência acomodada, eu dizia, a fez cega para o fato simples de que não vivemos sob um Estado de Direito Democrático, a única forma estatal que tornaria impossível uma presidência como a de Bolsonaro (inaceitável não apenas pelo que ele diz, mas, sobretudo, pelo que ele faz).

Foi essa cegueira conveniente (e perigosa) — compartilhada com toda a autointitulada esquerda e com os não menos autointitulados progressistas (entre os quais, hoje, Leitão deve se incluir) — que permitiu o alastramento do frentismo, esse frágil arranjo eleitoral (que dá às classes médias uma novo impulso ilusório de que “alguém” vai lutar por ela, ou seja, ela poderá continuar na arquibancada, indignada, atordoada, mas atenta… sei…), um frentismo que, como eu dizia, só vem dando certo porque Bolsonaro empregou os poderes do EDA de uma forma que, aparentemente, o impede de fazer maioria eleitoral para continuar. Se Bolsonaro tivesse usado de maneira menos imbecil os poderes do Estado que recebeu (dos tucanos e, depois, inalterado pelos petistas), seria imbatível nessa eleição. Por sorte, a “genialidade” atribuída a ele não foi suficiente para que atinasse com o que deveria fazer.

Bolsonaro sequestrou o 7 de setembro; os políticos profissionais sequestraram a Política. Embora se diga uma democrata, defensora de um suposto Estado democrático de direito, Leitão, viciada no autoritarismo brasileiro das facções políticas profissionais, adoraria trocar o prazer de derrotar Bolsonaro nas urnas pelo gozo de derrubá-lo com o autoritarismo “legal” e “institucional” disponível (via TSE?…), o que, se fosse possível, daria ânimo “novo” ao Estado de Direito Autoritário em crise de legitimação. E chove aplausos.

Fica o Registro:

[23:12] – Bolsonaro perdeu impulso hoje em quase todas as plataformas. Foi superado por Lula em mais de uma plataforma em que costumava vencer. O fato está sendo atribuído à morte da rainha Elizabeth, mas talvez não tenha sido só isso. Talvez tenha sido a ressaca sofrida ontem pelos fanáticos da base bolsonarista, que ficaram a ver navios com suas faixas e cartazes golpistas. Vamos ver melhor nos próximos dias.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *