MARINA DESCONSTRUIU A SI MESMA

 Carlos Novaes, 27 de setembro de 2014

 

Em post anterior, falei da fragilidade cada vez mais evidente de Marina, a se equilibrar (mal) entre duas frentes de ataque. Mas, se a fragilidade eleitoral dela ia ficando evidente, não enxerguei com suficiente clareza, então, que as motivações que poderiam levar o eleitor a abandoná-la eram mais sólidas do que uma aceitação pura e simples do impacto do ataque adversário, frequentemente muito baixo. Não, o eleitor não sucumbiu aos ataques, e pensar que sim é subestimá-lo.

Dito isto, é necessário avaliar a nova pesquisa DataFolha, que vai adiante do que a mais recente pesquisa IBOPE já mostrara: Dilma se recupera, enquanto Marina desaba e Aécio não altera a sua situação.

Os números novos mostram uma situação nova: eu subestimei a força da motivação para a transformação, não obstante eu a defenda. Ou seja, subestimei o eleitor…  Os eleitores que Marina tinha ganho e que a estão abandonando haviam identificado nela uma mudança adiante, mas se decepcionaram e recuaram para Dilma (movimento cuja possibilidade indiquei, mas não com a ênfase com que aconteceu). O que permite essa conclusão é o fato de Aécio ter ficado praticamente estagnado nesse ambiente turbulento: identificado como titular de uma proposta reacionária, ele não se beneficia da queda de Marina, quando ela perde eleitores que queriam ir adiante. Em outras palavras, o eleitor que oscilou namorou com a transformação, mas viu que se enganara e voltou à mudança tão limitadamente incremental quanto cheia de mazelas que o petismo representa.

Embora tenha, em vários posts, insistido que havia lugar propriamente eleitoral para a opinião transformadora, não enxerguei o quão decisiva ela iria se mostrar. Foi essa “prudência” que me cegou para a hipótese que se mostrou forte: grande parte dos eleitores que robusteceram a terceira via o fizeram não apenas para fugir da polarização PT-PSDB, mas para ultrapassá-la, potencial de mudança que eu já identificara em texto de 2009, e que se mostrou forte mesmo com Marina não empunhando claramente bandeiras transformadoras. Enquanto o eleitor que agora foge dela apostava no passado de Marina, eu ia constatando, junto com ele, que o passado não condizia em nada com as propostas e revisões de si mesma que ela apresentou, mas, nesse processo, subestimei a atualidade e a potência da minha própria teoria sobre a viabilidade de uma terceira via.

Quem acompanha este BLOG vê que quem desconstruiu Marina não foi exatamente o João Santana, mas a própria Marina, quando disse que nunca foi contra transgênicos; quando não mostrou a mais que sabida importância decisiva, ainda que relativa, do petróleo do pré-sal, inclusive para gestar fontes alternativas de energia; quando apresentou uma proposta de reforma política reacionária, que é o contrário de uma “nova política”; quando propôs uma mudança não menos reacionária no status do Banco Central como órgão do Estado; quando recuo da revisão da Lei da Anistia; quando tratou a desigualdade como problema a ser enfrentado apenas com políticas sociais compensatórias, sem a inclusão da matéria tributária; quando se calou quando o vice ruralista declarou que ninguém governa sem o PMDB e ainda propôs atenuar a bandeira do desmatamento zero; quando recuou na criminalização da homofobia; quando defendeu aliados atuais controvertidos invocando de maneira impertinente e injusta a figura incontrastável de Chico Mendes. Precisa mais? Bem, pois a propaganda e o discurso da candidata ofereceram: vêm reagindo aos ataques com apelos emocionais, quando se sabe que a fase da motivação emocional para o voto já ficou para trás — o eleitor quer alternativa.

Esse horrendo conjunto de descaracterizações pode não ter sido percebido em todo o seu alcance pelo eleitor que agora deixa Marina, mas certamente ensejou que o tiroteio adversário encontrasse lastro na opinião pública, pois deu repertório, e constitui a paisagem de escombros que serve de pano de fundo, às conversas dos transformadores enquanto tal, que não são legiões, mas parecem ter se tornado mais decisivos do que se havia antecipado para essa eleição. Ponto prá nós.

Marina vem perdendo os eleitores que queriam ir adiante, mas não haviam sucumbido ao anti-petismo histérico, e estéril. Desapontados com ela, voltam ao caminho que teriam preferido evitar. Resta saber agora se Marina também não perderá, num passo seguinte, os eleitores anti-petistas que ganhou de Aécio. Se isso acontecer, ela poderá ficar fora do segundo turno porque terá acontecido o que eu disse em post anterior, o mesmo que mencionei na abertura deste texto:

Ou seja, com suas propostas reacionárias e continuístas Marina se colocou de maneira perigosamente contraproducente no centro de um fogo cruzado: enquanto se combatem mutuamente, as campanhas de PT e PSDB dão também combate a Marina, cada uma dizendo o quanto ela se parece com o outro – Aécio diz que Dilma é um presente ruim que precisa ser deixado para trás e Dilma diz que Aécio é um passado que já foi ultrapassado e não se pode permitir voltar, embrulho no qual Marina vai sendo remetida ao endereço da inconsistência e, com isso, enseja a que os eleitores que atraiu de cada um dos dois lados refluam para o tronco de origem. (grifo de hoje).

8 pensou em “MARINA DESCONSTRUIU A SI MESMA

  1. Cristiane

    Olá Novaes!
    Tenho acompanhado seu blog e gostaria de sugerir uma análise da candidatura de Luciana Genro do Psol e sobre a opção do voto nulo.
    Enquanto Marina Silva perde-se cada vez mais na sua “nova política”, pelo que tenho acompanhado, principalmente em redes socias (que influênciam diretamente a decisão de votos do povo) a repercussão principalmente pós-debates tem aproximado muito a candidata e suas propostas destes eleitores que estão perdidos em meio a bandeja “meia-boca” de candidatos que nos é oferecida. Acredito que uma análise sobre Genro e PSOL será de grande valia, já que há até poucos meses o destaque se resumia na tríade Dilma, Aécio e Marina e aos desacreditados que optam pelo voto nulo por não se identificarem com os cadidatos, propostas e seus partidos e não querem optar pelo “menos pior”
    Um abraço, obrigada

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    1. Soraia Kuya

      Olá Novaes, aproveito o comentário acima da Cristiane, pra pedir se vc poderia comentar tbm sobre 1 velha questão, e diferença entre Luciana Genro e Eduardo Jorge (pra mim, os 2 candidatos mais razoáveis e que têm roubado a cena pela sinceridade): governar com alianças/ligações perigosas ou não?
      ela o acusa de se misturar com o PSDB em SP; e ele parece achá-la uma social-fundamentalista, ainda falando em luta de classes.. isso foi no último debate na record, pelo q vi depois na net.
      Já os outros 2 ‘nanicos’, Everaldo e Levy são tão burlescos.. q Luciana (de novo abrilhantando o debate) fritou Levy só com uma pergunta; pois ele respondeu/esbravejou tanta besteira, bancando o homofóbico recalcado, e escorregando no fisiológico/escatológico.. q virou piada no mundo, coitado..

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    2. Renato Domingues Diniz

      Boa Tarde, Novaes!

      Apoio o comentário acima sobre uma análise de um hipotético governo do psol. Se puder fazer uma análise, lerei com muito gosto!

      Abraço!
      Obs.: Você faz muita falta na bancada do Jornal da Cultura.

      Renato.

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  2. Rodrigo

    Mas um segundo turno entre PT x PSDB será um porre, mas de chatice, e não creio que Aécio consiga vencer Dilma Rousseff. Sua análise é bem diferente do que venho lendo na grande imprensa, Novaes, vale a pena lê-lo.

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  3. Jackson

    Acho que Marina tem um discurso romântico demais. Isso acaba cansando… As palavras soam vazias.

    Pés no chão sempre!

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  4. eder

    ue voce me parecia totalmente deslumbrado com a blablarina.Nunca me simpatizei com ela nem em 2010 muito menos agora quando o reacionarismo dela se expressa da forma mais grotesca possivel.Pode ser um preconceito terrivel mas acho que e um conceito so o fato dela ser evangelica me faz correr leguas falo como gay.Meu voto no 1 turno e da luciana.Porque os transformadores nao a apoiam se ela nao esta propondo uma hecatombe revolucionaria e sim um programa radical nos marcos do capitalismo?

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    1. Carlos Novaes

      1. Ué! acho que você precisa aprender a ler, pois ao longo das últimas semanas construí uma análise não dogmática sobre a candidatura da Marina, onde, até onde pude ver na WEB, há a única demonstração fundamentada do que há de reacionário e conservador no projeto encabeçado por ela, não apenas sem uma linha de preconceito ou baixaria, mas fazendo o combate desses recursos vis de campanha, também ele fundamentado. Onde o “deslumbramento”, ainda por cima “totalmente”!? Enfim, você precisa descobrir que hipérboles retóricas vazias não chegam a ser argumento.

      2. Para mim a questão não é de simpatizar ou não simpatizar, é de pensar.

      3. De fato, se para você a crença dela é vestibular ao esforço de entendimento acerca do que ela propõe, é preconceito, mesmo.

      4. Quem disse que transformadores não apoiam a Luciana? O problema dela é que todos os votos que ela tem provém de transformadores. “Ela” (não ela como pessoa/militante) não conseguiu ultrapassar a barreira que separa o projeto dela dos que querem transformação sem serem propriamente transformadores: largas franjas do eleitorado que anseia por uma terceira via, para ultrapassar a situação atual, indo adiante. Por que? É muito longo para explicar aqui e seria improdutivo, pois não haveria como ajudar a mudar a realidade.

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      1. Anderson Thadeu

        Olá Carlos Novaes!
        Num de seus posts anteriores eu fiz um comentário sobre alguns dos problemas que, para mim, inviabilizavam a candidatura da Marina como terceira via, como opção de voto. Alguns dias passaram-se e hoje a lista das incoerências se agigantou.
        Tenho acompanhado seu blog e também lido outros que tratam da corrida presidencial e não posso deixar de comentar que, em minha visão, você tem dado um retrato, ou porque não dizer, um raio-X, extremamente oportuno das propostas (ou então propostas) ofertadas pela referida presidenciável. No começo eu sentia pelos seus comentários que você torcia para que Marina acertasse o pé, porém com o decorrer da campanha…De qualquer maneira, continuo acompanhando seu blog porque você mantêm-se crítico e não encarna dogmas – um legítimo cientista.
        Por fim, gostaria de solicitar o que disse ser improdutivo: que falasse da proposta/campanha de Luciana Genro e quais seriam as possíveis complicações que ela enfrentaria numa, utópica (?), chegada ao Palácio da Alvorada.
        …e parabéns pela paciência e heroísmo na decifração do comentário inaugural.
        Um abraço e obrigado!

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