Carlos Novaes, abril de 2014
Alguém já disse que a história se dá por assim dizer duas vezes, na primeira como tragédia, na segunda como farsa. A farsa da junção heterodoxa de um Vargas paranaense com a Petrobrás do “pré sal é nosso” jogou Dilma no chão e escancarou à vista de todos a realidade da candidatura Lula a presidente em 2014. Os números desfavoráveis nas pesquisas são indicação ainda fraca das dificuldades que estão por vir, pois, por grande que ainda seja o contingente dos que apoiam Dilma, mesmo em meio deles já há um clima de “obrigado, mas já deu”, muito semelhante, como fenômeno entre simpatizantes, àquele que orientou a saída de Thatcher do governo inglês.
Lula vem pregando seus preguinhos no sarrafo da volta faz anos. A entrevista dada lá em Portugal foi bastante clara: distanciou-se uma vez mais dos indivíduos malfeitores, mas recusou a dimensão partidária do malfeito, numa acrobacia esperta típica: sinaliza sua condição de líder comprometido com o PT, afagando a militância burocratizada, mas reiterando a vigência de uma lei antiga do mundo petista: tudo é permitido, o êxito legitima, mas quem se inviabiliza fica sozinho. Se, diante dos figurões envolvidos no mensalão a burocracia não fez valer como devia essa lei, ele próprio, como líder máximo, não deixou de rezar por ela, deixando o juízo final para a história, a quem caberá absolver a todos.
Para quem há tempos entende como inevitável o “volta Lula” estava claro que fosse qual fosse o cenário deste primeiro semestre Lula teria de se mexer se quisesse mesmo voltar à condição de candidato presidencial. E ele tem se mexido, mas com cautela maior do que a esperada, e por duas razões: o cenário desfavorável faz pensar que teria engolido a ele próprio, e Dilma se mostra mais obstinada do que seria de se prever, tendo chegado já ao limite da fragilidade e do desespero quando vem a público mandar recado a Lula sobre a “lealdade” dele para com ela ou para dizer que será candidata mesmo sem apoio da base aliada – coitada.
E coitada porque ou Dilma não será mesmo candidata, tendo que se contentar com a dignidade postiça da desculpa de última hora de não misturar o exercício do governo com a busca por êxito eleitoral para si; ou será candidata se Lula entender que não há caminho para a vitória, ou que o risco de ele próprio perder é muito alto, abandonando-a ao sacrifício. Este último caso é possível, mas menos provável porque o anúncio da volta de Lula despertaria um entusiasmo que tenderia a superar o que há de artificial, de fabricação adversária, na crise que envolve o petismo, relançando as possibilidades de vitória e, portanto, as condições de rearranjar de modo mais favorável a chamada base aliada e, até, quem sabe, de ampliá-la com um Eduardo Campos na vice. Vamos ver por que caminhos se dará a volta como farsa, pois a tragédia Getúlio já protagonizou.