Carlos Novaes, junho de 2013
O que impediria Lula de ser candidato a presidente em 2014 é sua recusa pessoal a entrar na disputa, situação que, entre outras coisas, expõe a fraqueza de Dilma como eventual candidata: ela jamais teve, tem ou teria qualquer condição de impedir uma candidatura de Lula em substituição à sua própria. Essa menoridade da presidente não escapa a ninguém – agora ela é o nosso Medvedev.
Se é assim, porque acreditar que não será Lula o candidato do PT em 2014?
Dentre as razões para que alguém acredite que Lula efetivará a recusa de que tem falado estão o apego dele à palavra dada, ou seja, o fato de ter dito que a candidata é Dilma; a saúde, ou seja, a condição de quem venceu um câncer e sofreu seus efeitos conexos; o cansaço/inapetência, ou seja, ele estaria farto da ação política; o cálculo, ou seja, ele avaliaria que a situação não parece favorável a um bom desempenho na disputa pela presidência.
Nenhuma delas resiste ao exame mais simples: desde sempre sabemos que não há político cuja palavra dada não possa ser revista sob argumentos como “se é para o bem de todos e felicidade geral da nação”; a saúde de Lula é, hoje, provavelmente melhor do que em 2006, pois com o susto adotou cuidados jamais experimentados antes; melhor atestado disso são suas viagens pelo país e suas aparições na TV, que indicam, aliás, não haver sombra de inapetência pela ação política exaustiva; finalmente, por mais preocupantes que sejam os números da realidade econômico-social brasileira, eles sempre poderão ser atribuídos pelo petismo justamente ao fato de que Lula não é o presidente…
Há ainda uma razão, que deriva do cenário circunscrito pelas anteriores, para que Lula venha a ser candidato a presidente em 2014: em 2010 o eleitor que queria Lula na presidência votou em Dilma não apenas porque Lula pediu, mas também porque entendeu que Lula estava impedido constitucionalmente de disputar um terceiro mandato seguido. Ora, como Lula vai solicitar ao eleitor que transfira para Dilma o voto que quer dar a ele em 2014, quando reúne todas as condições de ser ele mesmo o candidato? Essa inconsistência contrariaria o eleitor petista e abriria uma janela de incerteza na cabeça do eleitor não petista que quer Lula de volta.
Mesmo diante desses argumentos, em conversa com amigos alguém sugeriu uma razão diferente, de ordem, digamos, místico-psicológica: Lula não seria candidato por temer repetir Getúlio Vargas, que voltou à presidência em 1951 depois de um intervalo de quatro anos (período para o qual o Brasil elegeu presidente, com apoio de Vargas, o Marechal Eurico Gaspar Dutra – 1947-1950) e se viu enredado numa “maldição de segundo mandato” tropical que lhe custou a vida para preservar parte da excelente imagem pública de que desfrutava até e eclosão do, por assim dizer, “mensalão” da época.
O argumento é interessante, mas ultrapassado. Interessante porque todos sabemos que Lula tem Vargas na cabeça, a tal ponto que ao ser reeleito em 2006 começou a providenciar o seu próprio Dutra, ou seja, alguém que, desprovido de personalidade política própria, pudesse sucede-lo sem despoja-lo do controle das variáveis para a eleição presidencial seguinte (1950 e 2014). Tal como Vargas, que adotou Dutra, Lula indicou Dilma.
Se algum dia houve razões para que o trauma vivido por Vargas pudesse ser empecilho pessoal à postulação de Lula em 2014, o próprio Lula acaba de deixar claro que as superou: em declaração recente, comparou o mau momento vivido no estouro do mensalão em 2005 precisamente com a situação que levou Vargas ao suicídio em 1954, deixando claro que, ao contrário de Vargas, derrotou as elites perniciosas de sempre. Lula tem para si que já superou a “maldição”, uma vez que já voltou à presidência, num segundo mandato concluído com muito êxito na opinião pública depois de um escândalo que poderia ter lhe custado os favores dela. Ou seja, livre do mensalão e de Getúlio, nada há de sólido no caminho de Lula para ser candidato a presidente em 2014, salvo ele mesmo.