Para Bolsonaro e sua horda, o vírus é só mais um player do mercado.
Carlos Novaes, 30 de março de 2020
Com a desenvoltura de quem se move em estado de natureza, Bolsonaro e sua horda vivem a pandemia do coronavírus como uma expressão do mercado da luta pela vida: que sobrevivam os mais fortes, com o detalhe de que essa força está atrelada à capacidade de fazer e de estocar dinheiro. Bolsonaro, Justus & Cia se sentem genuinamente afrontados pelas providências que estão sendo tomadas contra o vírus pelo mundo afora precisamente porque não possuem a agilidade intelectual necessária para adaptar o credo liberal de que são adeptos quando ele é desmentido, mesmo quando o desmentido tem o tamanho e a virulência de uma pandemia.
– Bolsonaro se elegeu com o discurso de diminuir e enfraquecer o Estado – o vírus exige atuação forte do Estado;
– Bolsonaro se elegeu enaltecendo a eficiência das forças de mercado – o vírus mostra-se um potente agente no mercado da luta pela vida, por que combatê-lo?!;
– Bolsonaro se elegeu fazendo a defesa do mérito individual na luta pela vida – o vírus teima em não aceitar o mérito individual como defesa eficaz, e exige combate coletivo;
– Bolsonaro se elegeu combatendo a ajuda aos mais fracos, vendo a solidariedade como o elogio da fraqueza – o vírus exige proteger os mais fracos numa ampla rede de solidariedade;
– Bolsonaro se elegeu surfando uma onda anti-científica – o vírus exige o emprego cerrado da ciência;
– Bolsonaro se elegeu e se conduz contra a imprensa livre e favorecido pela mentira – o vírus requer amplo esclarecimento midiático sobre suas causas, males e forma de disseminação;
– Bolsonaro se elegeu fazendo o elogio e a promessa de mais autoritarismo – o vírus exige engajamento voluntário, seja na prevenção, seja no combate direto a ele;
– Bolsonaro se elegeu desdenhando a desigualdade – o vírus expõe as mazelas da desigualdade, seja no despreparo sanitário para o combate a ele, seja na fraqueza econômica para resistir aos danos, mesmo aos mais imediatos.
Deixo ao leitor continuar a lista. Qualquer que seja a extensão dela, deveria estar claro que, ao contrário do que muitos supunham, Bolsonaro está agindo segundo o que prometeu em campanha, e o faz conforme suas crenças mais arraigadas, pois não tem recursos cognitivos para agir diferente, para se adaptar à realidade quando ela contraria tão fortemente essas crenças. Ele se sente afrontado pela realidade e se refugia em esperanças vãs de que ela se altere a seu favor. Não tem como dar certo. A cada dia que passa Bolsonaro se torna um problema menor e, em breve, será o menor dos nossos problemas, deixado a falar sozinho.
Dessa mesma perspectiva, não vejo razão para imaginarmos que o mundo que sairá dessa pandemia será muito diferente, que haverá um antes e um depois… Como se a pandemia, que apropriadamente empurrou a todos na direção de soluções conservadoras (afinal, trata-se de conservar a vida) pudesse vir a alterar a máquina do mundo. Quase chega a ser divertido ler ou ouvir o que tem sido dito a esse respeito, sempre na base do “nada será como antes…”. As memórias dos tempos normais se reinstalarão e o novo coronavírus passará a ser um assunto velho. Esse filme já nos foi mostrado na peste negra, na gripe espanhola. Por muito tempo depois de vencida a pandemia, tudo será como antes, leitor, só que pior… – o que deveria aumentar nosso esforço para compreender e buscar transformar a ordem que nos infelicita, cientes de que transformações benignas só são possíveis quando ultrapassamos o limiar da vicária “união nacional”, bandeira sempre invocada para evitar a opinião e a ação discordantes, que desafiam a ordem instalada.
Prezado professor Carlos Novaes. O acompanho há bastante tempo. Fico muito feliz por poder voltar a ler suas análises brilhantes. E, lamento que sua voz esteja ausente no debate público mais geral e visível – bastante pobre por sinal.
Grato, Caio. Abraço
Novaes, volte com as suas análises, por favor.
Apareça, precisamos do seu conhecimento nesta hora, estamos órfãos de suas análises e textos. Está fazendo uma enorme falta suas análises.
Sou seu leitor, Novaes volte!
Olha aí, Marcos. Estou tentando… abraço
Profº Carlos Novaes,
Por onde você anda?
Cadê as suas análises?
Por favor, faça um canal no Youtube com as suas analises. Admiro muito as suas avaliações, sempre que podia acompanhava você no Jornal da Cultura.
Um abraço!
Publiquei uma nova análise, Rodrigo. Abraço.
Novaes, sou seu seguidor de longa data.. .por favor considere a sugestão de abrir canal no YouTube, entrar nas redes sociais….
Professor, que bom que voltou a escrever é sempre um grande prazer ler suas análises, por favor, peço humildemente e com certo desespero, volte a escrever aqui, nos dê uma luz e nos ajude a entender essa conjuntura política. Por favor.
Grato, João. Vou me empenhar. Abraço.