RENDIDO, O FRACOTE ESPERNEIA

Carlos Novaes, 30 de março de 2021, às 02:08h

Com acréscimos no segundo parágrafo às 10:40h

Não se deixe levar pelo alarido da mídia convencional, leitor. As últimas horas sugeriram uma hecatombe, mas, como não poderia deixar de ser, a montanha pariu um rato. Veja só o contraste entre sonho e realidade: o sonho do besta sempre foi obter apoio das FFAA para poder impor a todos, inclusive ao Centrão, seu obscurantista programa máximo; a realidade é que ele, sem apoio das FFAA para aventuras ditatoriais, teve de se render ao Centrão e, agora, escancarar essa rendição com a demissão, a pedido do mesmo Centrão, do porta-voz mais obscurantista do seu programa máximo.

Note bem, das seis mudanças ministeriais, em apenas três pastas houve demissão de ministro: um caiu porque sua cabeça fora pedida pelo Centrão; outro porque explicitava a recusa das FFAA em dar lastro a que a besta pudesse peitar o Centrão. A primeira demissão foi uma deposição de armas; a segunda foi uma vingançazinha contra quem lhe negou a força das armas. Já a queda do chefe da AGU foi uma punição por desobediência que também denota fraqueza, não força: o ministro se recusara a assinar uma solicitação do besta pela qual ele pretendia justamente mostrar força: arrancar do STF uma condenação às ações de governadores contra a Covid.

Um gesto complementa o outro e todos apontam na mesma direção: Bolsonaro está sem saída, pois sua rendição ao Centrão já fora resultado da falta de apoio das FFAA para quiméricas ambições ditatoriais, como discuti aqui. Observe-se que os escolhidos para as vagas abertas com as demissões e remanejamentos obedeceram à mesma lógica de fracote acuado: colocou um nome do Centrão no coração do governo, trouxe um nome próximo à bancada da bala para o ministério e nomeou chanceler um membro paisano do círculo pessoal.

Olhada com cuidado, isto é, como um ato hostil ao alto comando das forças armadas, a mudança na Defesa se mostra quadruplamente positiva: primeiro, ela deixa claro, mais uma vez, que Bolsonaro não tem apoio das FFAA para aventurar-se pela via do golpe; segundo, há menos um militar de alta patente no ministério; terceiro, engolir a mudança hostil reitera que as FFAA devem obediência constitucional ao presidente, gostem dele ou não; quarto, a contrariedade da alta oficialidade com Bolsonaro só aumentou.

Evidentemente, o resultado de tudo isso é que Bolsonaro só poderia estar a alimentar fantasias golpistas com base na PMilícia, uma alternativa cujo irrealismo já vimos e só aumentou. Na verdade, o besta está ainda mais dependente do Centrão e do jogo propriamente eleitoral. O resto é blefe, histeria desinformada ou má fé.

5 pensou em “RENDIDO, O FRACOTE ESPERNEIA

  1. Soraia

    A/O Besta
    Sinônimos possíveis, colados d G. Rosa*:

    “O Arrenegado, o Cão, o Cramulhão, o Indivíduo, o Galhardo, o Pé-de-Pato, o Sujo, o Homem, o Tisnado, o Coxo, o Temba, o Azarape, o Coisa-Ruim, o Mafarro, o Pé-Preto, o Canho, o Duba-Dubá, o Rapaz, o Tristonho, o Não-sei-que-diga, O-que-nunca-se-ri, o Sem-Gracejos… Pois, não existe! E se não existe, como é que se pode se contratar pacto com ele?”

    Pois q no Brasil Ele existe, espalhou a peste e vive d pactos, antes mais esconsos agora descarados, viralizando na mídia, net.
    Q acontece conosco?
    Foram os quase 400 anos d escravidão, q além das vítimas negras q até hj pagam a conta, ainda deixaram nossa índole tão mosca-morta, zumbis d nos mesmos??
    Enquanto colo/escrevo isso aparece no fantástico o caso Henry, e vemos como A Besta deu muitas crias por aqui, filhotes como ‘Dr Jairinho’.
    A Besta se ri, se chama d doutora e reina via funcionalismo publico, sem necessariamente ser ‘animai político’, nem ter carisma precisa mais.. pode ser horrenda, com seus dentes d chumbo gritando: Brasil, me ame! Polarize, viralize ou me deixe!!!!
    Quem sair por último apaga a luz?
    Se quem sobreviver ao vírus vir um segundo turno entre Lula e Bolsonaro.. verá algo na escuridão?

    • In Grande Sertão: Veredas
    Abril Cultural, São Paulo, 1983

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  2. Ricardo

    Prezado Novaes,

    Sei que é muito difícil ser pragmático em se tratando de análise política nesta pátria onde voga o estelionato eleitoral e coalizões fisiológicas. Mas, quando revisitamos nossa história recente, deparamos com o presidente FHC, articulador político competente que termina seu primeiro mandato com grande índice de aprovação e que, ainda assim, não ousa mudanças muito enérgicas e imprescindíveis para minar a escandalosa disparidade socioeconômica nacional. Após ele, um outro político exemplar, do ponto de vista da capacidade de mobilizar forças sociais, toma posse com as mais doces processas à classe trabalhadora, e, mesmo gozando de apoio popular invejável, mantém o status quo deixado pelo partido que o precedeu. Deixo claro que estou a falar aqui da não adoção de impostos progressivos, de reforma agrária, da revisão de política monetária e outras mudanças que a esferas fiscal, tributária e eleitoral reclamam até hoje.

    Estes dois presidentes importantíssimos (e podemos dizê-lo mesmo conscientes de suas respectivas falhas políticas e morais), que são figuras de um vulto muito maior que o de Bolsonaro, não gozaram da autonomia que todo chefe do executivo sonha, e tiveram que se dobrar em nome da preservação da base necessária no Congresso Nacional. E assim finalmente chego às perguntas que ora me faço:

    Bolsonaro conseguirá, nesta segunda metade de seu mandato, entregar alguma coisa ainda do que prometeu em campanha, ou finalmente foi “transformado numa rainha da Inglaterra”, o que tanto temia? Se golpe nenhum virá da parte dele, com apoio das Forças Armadas, seria justificado, então, pelo menos o temor de uma escalada populista dele nesta reta final para se segurar na cadeira presidencial por mais 4 anos?

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    1. Carlos Novaes Autor do post

      Esquematizando muito o que já expliquei em muitos posts, FHC e Lula tiveram a (para usar a sua expressão) “autonomia” necessária para forjarem uma aliança e derrotarem o atraso, Preferiram uma polarização fajuta que nos trouxe até Bolsonaro. Felizmente, Bolsonaro não conseguirá entregar NADA do que prometeu, ainda que farrapos do que prometeu já venham deixando um legado de estragos. Não vejo como ele ainda possa se recuperar a ponto de vencer uma eleição em dois turnos, mas é cedo para ver com clareza.

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  3. Luiza

    Caro Novaes,
    Vc acha mesmo q Bolsonaro não tem apoio das FFAA? Não consigo ver isso, levando-se em conta q tem mais militares em cargos do governo do que na ditadura pós 64. Eles tb apoiaram a prisão do Lula, o q beneficiou, pra dizer o minimo, a eleição de bolsonaro. A mim me parece mais um “telecatch” pra que fique td como está. O q vc acha? Obrigada.

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    1. Carlos Novaes Autor do post

      Luiza, caiu o ministro da Defesa, seguido dos chefes das três forças militares, que se declaram contrários aos desejos golpistas do besta. O general responsável pelo combate à Covid no Exército declarou que ali se segue a ciência. O que mais precisaria acontecer para que as pessoas vejam o óbvio: Bolsonaro não tem o apoio das FFAA para dar um golpe a favor de si mesmo. O fato de haver muitos militares no governo não significa que eles entrariam na aventura de um golpe. Eles estão ganhando dinheiro, mas dentro da ordem atual. No governo Lula e Dilma as FFAA se sentiram mais respeitadas do que agora, como essas demissões e recusas a atos de Bolsonaro deixam claro. Bolsonaro não tem como deixar que “td fique como está”, afinal, ele está indo ladeira abaixo, cada vez mais fraco. Se ele resistir até o ano que vem, haverá uma chance mínima de se revelar competitivo na eleição, se uma recuperação econômica mundial pós-Covid (se houver…) carregar o Brasil. Mas, mesmo assim, vai ser difícil para ele.

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