Carlos Novaes, 15 de março de 2018
O assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL) não é mais um episódio da chamada violência que assola o Rio.
O fato de a vítima ser uma mulher valente, em pleno vigor de moça madura, negra, da periferia, mão solteira, que teve de fazer das tripas coração para tomar o próprio destino nas mãos, não é um acaso. Marielle simbolizava aquilo que o Brasil do mando faccioso não aceita, não reconhece, não tolera e, sobretudo, teme. Essa morte vem sendo tecida, fio a fio, desde o Brasil mais longínquo.
Quem não morrer um pouco do tiro que matou Marielle, estará pronto a morrer por inteiro na próxima bala “perdida”.
Quem não chorar diante desse tiro, não vai chorar diante de mais nenhum.
Quem não disser intolerável esse tiro, não o dirá de mais nenhum.
Quem não ficar alerta ao som desse tiro, estará surdo para qualquer outro.
Morta, Marielle se faz símbolo da inércia da maioria da sociedade diante da luta de facções deflagrada no âmbito da crise de legitimação do Estado de Direito Autoritário brasileiro.
O assassinato de Marielle se fez ponto de convergência de quatro vetores facciosos, cada um deles plural, por sua vez:
– primeiro, as facções milicianas saídas do dispositivo militar que nos foi legado pela ditadura paisano-militar na forma da Polícia Militar (que, não obstante, ainda conta com gente de bem em suas fileiras);
– segundo, as facções criminosas que vêm se organizando a partir das entranhas da estrutura penitenciária do Estado de direito;
– terceiro, as facções paisanas que controlam o Estado do Rio há décadas e, agora, se veem ameaçadas pela ação não dos bandidos, mas das
– quarto, facções federais que não hesitam em sacrificar seus ex-sócios locais em prol de uma reconfiguração que a crise de legitimação do Estado está a impor, mobilizando, para isso, as FFAA, o dispositivo militar cabal da ditadura de 1964-1989.
Tivesse eu esperanças, diria que essa morte tem de se fazer mortalha da nossa indiferença social, da nossa inércia política, da nossa burrice ideológica.
[Acréscimo às 22:40]:
Fica o Registro:
- Enquanto isso, a marcha facciosa do baronato do Judiciário seguiu em frente na defesa desse escandaloso “auxílio moradia”, tendo o descaramento de tentar vincular essa aberração remuneratória à força do Judiciário e à autonomia dele. São uns caras de pau!
Sempre ponderado, em plena coerência.
Aprecio muito seus textos, outrora seus comentários; suas observações. Grato!
Obrigado. Vamos tentando…